Tuesday, June 15, 2010

O escritor

Pergunto-me sobre a situação do escritor nacional. Não somente o escritor, mas o artista em geral, no Brasil, não possui qualquer reconhecimento que, em outros países, e visto como uma valorização a expressão cultural, seja ela contempôranea ou clássica.
Sendo um escritor me deparei com diversas barreiras e refleti sobre a nossa situação em diversos instantes.
Uma vez um amigo, também escritor, me disse algo que é fácilmente visível nos escritores nacionais: "Os escritores daqui (do Brasil) escrevem para críticos e para acadêmia literária." O que é uma realidade que chega a ser triste, pois alguns críticos - principalmente a acadêmia literária - possuem ainda uma mente muito voltada a estruturas, gêneros e temas clássicos, deixando de fora a contemporaneidade. A grande maioria da literatura nacional que consegue ser publicada (com exceção de artistas já famosos, como por exemplo Lobão, Paulo Coelho e afins) seguem um padrão moralístico em suas obras. Poderia dizer, "nacionalista" até.
O Brasil perdeu sua idêntidade cultural, acredito que por dois grandes motivos (apesar de existirem muitos outros): primeiro por ser uma sociedade com uma miscigenação incrível, o que é bom e ruim ao mesmo tempo. A segunda, talvez, justamente pela cultura não se adaptar ao tempo atual.
Kawabata, no pós guerra, escrevia sobre as mudanças culturais sofridas no Japão pelo ocidente. Muitos o criticavam, mas o autor retrucava que o trabalho do escritor é adaptar ao atual e isso - essa mudança - é um fator real que, não importa o que se faça, vai acontecer querendo ou não; cabendo, assim, ao escritor manter os valores tradicionais incorporando-o com o novo. Isso, acredito, é algo que não ocorreu com a mentalidade que temos.
Os EUA se tornaram grandes leitores por incorporar o mercado literário nacional com o estrangêiro, dando uma acessibilidade a novos autores (tanto os nacionais quanto aos internacionais). Isso foi bom e ruim, porém não deixa de ser acessível para escritores iniciantes. A visão deles, porém, é muito diferente da brasileira e chega a ser similar a literatura pop japonesa. Ver a literatura como um mercado trouxe inumeras vantagens e desvantagens (como qualquer outra coisa).
Hoje, no Brasil, vemos pessoas cada dia mais lendo, porém quantos desses leitores estão com livros nacionais?
É fácil dizer que não existem escritores nacionais, que nascem póstumos... porém a mentalidade do escritor como a das editoras permanece em um mercado pequeno, mas certo. Seria arriscado colocar novos autores (se é que eles existem) de qualidade (se é que isso existe).
Mas não posso ver somente um lado, os escritores também tomam uma parcela de culpa nessa história. Acreditando ser fácil escrever um livro, muitos começam a escrever acreditando que sua obra é um "bestseller". Essa característica precoce acaba piorando ainda mais a situação dos novos escritores.
Talvez, para o novo escritor, a visão de que "escrever é fácil" e de que "qualquer um pode fazer isso" tenha entrado na mente como um veneno, dando origem a trabalhos ruins. Alguns podendo até possuir potêncial.

Um outro fator é a acessibilidade de hoje, a incorporação do meio digital ao literário é um avanço já notado por muitos países, o Brasil ainda engatinha muito atrás. Blogs, sites, publicações concorridas, são meios grátis da expressão literária que alguns anos antes não era possível. No entanto, para muitos da acadêmia e da crítica, o meio digital ainda é marginalizada e por esse motivo, descartada. A idéia pré-concebida da "contemporaneização" (inventando palavras aqui, acredito eu) ser algo ruim, edificou uma barreira muito triste para novas possíbilidades para a literatura nacional.
O reconhecimento do escritor, aqui, é póstumo. Em um país onde tudo se leva ao famoso "Q.I." (Quem Indica) é triste perceber como a cultura, a literatura, a arte em si, acabaram vítimas desse jogo de interesse, limitando assim novos escritores e, consequêntemente, uma adaptação da nossa literatura nacional, deixando o acesso a poucos (talvez isso seja válido tanto para autores como para leitores).
Existe, é claro, a imagem que se disseminou na década de 80, a mentalidade de que "o que é importado é melhor" e de fato, muitas coisas são, mas o Brasil também possui esses valores, mas não são explorados, são esquecidos e violentados por interesse de poucos. Me pergunto se é estranho eu ver o Brasil como o mundo a séculos atrás, onde a literatura era algo reservado a elite da sociedade... me pergunto se não seria assim a nossa acadêmia. Não quero generalizar, existem exceções, mas infelizmente a minoria possui, pelo menos ainda, uma voz muito fraca.
Como escritor e ávido leitor, espero que isso mude, principalmente porque percorro caminhos muito diferentes das nossa acadêmia atual, pelo menos como a vejo hoje.

Lembro o que Marçal Aquino disse em uma entrevista (escritor brasileiro, hein!) de que "no Brasil, infelizmente, escritor não é uma profissão."
Ninguém nunca poderia estar mais certo... infelizmente.
Quem sabe isso não mude... Ou talvez seja meu sonho infantil de escritor falando mais alto e deixando a realidade (como qualquer bom romancista/contista) lá pra baixo.

3 comments:

André Freitas said...

Ontem faleceu Massao Ohno, responsável pela criação do movimento importantíssimo na literatura, especialmente na poesia, poetas paulistanos dos anos 60, deu reconhecimento a muita coisa boa, e ele bancava do bolso dele as impressões, distribuição, etc. Enfim, ele faleceu e nenhum jornal noticiou. Quer coisa pior que isso? Um ícone em nosso meio artístico (meio artístico de fato, ARTE na acepção pura da palavra) falece, e você fica sabendo por vias escusas.
Eu concordo com quase tudo que você disse. E eu sinceramente quero que a academia se foda. Eu não entendo por que o Mirisola insiste em reclamar dos concursos e afins que são falcatruas mesmo (acho que ele tem isso como bandeira, denunciar essas coisas. Um trabalho importante), enquanto ele tem um monte de leitores. Os livros dele vendem. HOJE, para mim, é o que importa, se vão me taxar de maldito, bendito, cair nas graças de alguém, não importa. O importante é ser lido. Portanto, se você está contracorrente, como eu acho que deve ser, inconformismo à enésima potência, e conseguir leitores, o trabalho está bem feito.
Gostei de ver que se enquadrou como escritor. Ergamos a bandeira!
Put an end to the bullshit.

Abraços.
André

os intocáveis said...

NOSSA!

Doroni Hilgenberg said...

Concordo com você.
Bem que g ostaria que " ser escritor" fosse uma profisão valorizada.
Já tive um texto meu ilustrando um livro didático da 8 série fundamental No entanto, por mais que eu peça, o livro não me chega as mãos.
Ser Academico ou não, é apenas um detalhe, o mais importante é conseguir escrever bons livros que prenda o leitor para conseguir reconhecimento. No entanto essa opoirtunidade não nos é dada, pois as editora seleciona a dedo os escritores que já possuem nome na praça. E os novos? que se danem. E tem muita gente que escreve bem...
bjs